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Bem-vindos. Este é um espaço de reflexão sobre temas de investimento e onde se procura contribuir para uma melhor vida financeira. Atenção que todos os artigos são opiniões e não constituem recomendações de investimento. Votos de boas leituras!

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O que nos espera em 2020?

Estamos numa altura do ano em que nos mercados financeiros aparecem muitas entrevistas, análises e eventos relacionados com os eventos do ano anterior e as previsões para o ano que começou.

Ao mesmo tempo, por coincidência, tenho em minha casa duas crianças que descobriram os sketches do Professor Chibanga, criados pelos fantásticos Gato Fedorento.

Que fit perfeito.

PREVISÕES…

Professor Chibanga: “O Professor Chibanga adivinha que em 2010, em Agosto, dia 13 de Agosto, o mundo... vai continuar!”

Entrevistador: “Ah, pensei que ia dizer que o mundo ia acabar!”

Professor Chibanga: “Não, isso é estúpido, prever que o mundo vai acabar. Porque, se o mundo acabar, não está cá ninguém para dizer ‘Boa, Chibanga! Adivinhaste que o mundo ia acabar’ E assim, se continua, as pessoas dizem ‘Boa, Chibanga, o mundo continuou como tu disseste!’”

NOS MERCADOS FINANCEIROS

Nos mercados financeiros temos, maioritariamente, o mesmo comportamento. O CIO da Gestora X diz algo que tendencialmente redunda em: “Os mercados financeiros manterão sensivelmente o mesmo comportamento que vêm apresentando”.

Muito embora, nos mercados financeiros, tenhamos também aqueles que prevêem o fim do mundo: “Este ano vamos ter uma correcção” (repetir todos os anos até acontecer e passar a guru).

Típico mesmo, é termos textos com brilhantes explicações do passado recente, criando assim na assistência a impressão que os eventos passados são previsíveis e foram previstos. Não são e não foram (embora muitos profissionais dos mercados, como todos os humanos em geral, sofram de hindsight bias e, mesmo não tendo previsto esses eventos, interiorizam e acreditam piamente que o fizeram).

Para nós, analisar o passado tem valor acrescentado. Fazer previsões sobre eventos fora do nosso controlo não tem e não o faremos.

Provavelmente das análises do ano passado constarão vários comentários sobre Trump. Mas, quantos é que há poucos anos, sequer o consideravam como potencial candidato? E, quando já se falava da sua potencial eleição, quantos diziam que os retornos de mercado seriam sequer positivos, quanto mais da magnitude do que veio a acontecer?

MAS ENTÃO NÃO SE SABE NADA?

A pergunta que nos fazem é: Então, como é possível gerir? Como se consegue navegar nos mercados sem previsões?

Nós focamo-nos na história e nas probabilidades. Sabemos o que funcionou no passado e o que tenderá a funcionar no futuro e focamos os nossos esforços em fazer com que os investidores conheçam os vários comportamentos dos mercados e como actuar perante esses comportamentos. O maior inimigo do investidor é provavelmente ele próprio, como dizia Ben Graham.

No ano de 2019, os mercados accionistas apresentaram uma rendibilidade próxima de 30%. Que implicações terá isso para 2020? Olhando para a tabela de frequência de anos com retornos desta magnitude, temos que no ano seguinte a uma subida forte do mercado tivemos vários anos em que os mercados voltaram a subir fortemente e outros onde existiram correcções.

Anos com retornos entre +25% e +35% e retorno no ano seguinte (S&P500 sem dividendos):

1928: 37.88% => 1929: -11.91%

1936: 27.92% => 1937: -38.59%

1938: 25.21% => 1939: -5.45%

1945: 30.72% => 1946: -11.87%

1955: 26.4% => 1956: +2.62%

1975: 31.55% => 1976: +19.15%

1980: 25.77% => 1981: -9.73%

1985: 26.33% => 1986: +14.62%

1989: 27.25% => 1990: -6.56%

1991: 26.31% => 1992: +4.46%

1995: 34.11% => 1996: +20.26%

1997: 31.01% => 1998: +26.67%

1998: 26.67% => 1999: +19.53%

2003: 26.38% => 2004: +8.99%

2013: 29.6% => 2014: +11.39%

2019: 28.88% => 2020: ????

Conclusões: Depois de uma subida entre +25% e +35%, situação que ocorreu 15 vezes entre 1928 e 2018 (17.5% dos anos), tivemos:

  • 9 anos de subida (60%) e 6 anos de queda (40%). A estatística geral com todos os anos é 68% anos positivos e 32% anos negativos.

  • Em média, o mercado subiu +2.9%, com uma média de +13%, se for um ano de subida, e -14% se for um ano de queda. A média geral é +7.3%, com +18.3% nos anos de subida e -14.7% nos anos de queda.

Portanto, após um ano muito forte, aparentemente, teremos com grande probabilidade um ano mais próximo da média, mas não é de modo algum obrigatório termos um ano de correcção forte.

Podemos ter uma correção? Sim, claro. Como em qualquer altura do mercado. Essas correcções é que fazem com que os retornos a longo prazo sejam interessantes.

O risco está na base do retorno.

AS PERGUNTAS QUE DEVEMOS FAZER

Portanto, temos de perguntar a nós próprios se as nossas condições se alteraram:

  • O nosso horizonte temporal de investimento mantém-se longo?

  • Estamos preparados para suportar quedas intermédias dos mercados sabendo que, aguardando, estes tendem a produzir melhores retornos a longo prazo?

  • Estamos a investir apenas aquilo que estamos dispostos a eventualmente perder?

  • A nossa alocação de activos (mix de activos com risco, tais como como acções, com activos mais conservadores, como obrigações, depósitos, certificados, etc) está ajustada ao nosso perfil?

Tudo questões mais sobre nós próprios como investidores do que sobre os mercados em geral.

Para termos sucesso a investir nos mercados financeiros, apenas temos de ter a convicção que as quedas tendem a ser temporárias e que os mercados, numa base global, sempre valorizaram no longo prazo e tenderão a fazê-lo no futuro. Prever o fim do mundo não tem tido grandes resultados.

  • Estamos a investir em empresas sólidas e com grande capacidade de aguentar os naturais ciclos de mercado, ficando ainda mais fortes?

  • Estamos a investir de forma diversificada e global, com custos baixos?

  • Temos uma exposição a várias classes de activos de modo a atenuar as naturais flutuações, especialmente dos mercados de maior crescimento e, assim, também maior risco?

O novo ano é uma boa altura para analisarmos os nossos objectivos e o nosso horizonte temporal, de modo a aferir a nossa capacidade de assumir risco, bem como a nossa necessidade e a própria vontade de o assumir. Mas para o bem estar do investidor, este, na nossa opinião, deve ignorar grande parte do ruído de mercado - incluindo os Professores Chibangas deste mundo.

Luís Lobo Jordão, CFA